Thursday, December 20, 2012

O PECADO



Ouvi a tua voz rasgar as folhas
estava nua
tive medo e escondi

os meus olhos.


7/12/2012


[Franz Von Stuck, O pecado (Die Sünde)]

Sunday, December 02, 2012

Do outro lado do ribeiro de Cedrom




Preciso das vossas mãos para velarem comigo
porque tenho o peso do mundo
no meu coração, as mãos que trabalharam as redes
as vossas mãos rudes que amaram o mar
para segurarem o cálice, e dos vossos olhos
para desvelarem comigo a cortina da noite
a minha alma está pronta, o corpo
não, é uma rosa triste, madura
uma rosa de terra perante a morte.

12/10/2012

Monday, November 26, 2012

"Verdade, relativismo e anti-cristo"



No Blog "A Fé Explicada", fui citado num artigo, "Verdade, relativismo e anti-cristo". Agradeço.  

 

 "O relativismo cultural é apenas uma tentativa de domesticação das mentalidades (...) Assim como Jesus teve um precursor a preparar o seu caminho, não é de admirar que o Anti-Cristo também tenha os seus. E quem são estes?
João Tomaz Parreira em seu artigo “Relativismo, Relativismos” nos mostra, veja
mos:

“Não é por acaso que entre os antropólogos se defenda o relativismo cultural e os relativismos derivados, uma vez que o ser humano pretende colocar tudo ao mesmo nível, Deus, o homem, as culturas, a moral, a ética, tudo é igual, tudo se relaciona sem absolutos. Também que toda a conduta do Homem é boa em si mesma, natural e importante, em todos os contextos é o ser humano que impera. O relativismo é mesmo característico do agnosticismo no seu conjunto. A obediência a Deus não é uma pura convenção ética que pode mudar e adapatar-se às circunstâncias e normas vigentes na sociedade.” "

Monday, October 08, 2012

AS TRÊS MULHERES




 "E, passado o sábado, Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para irem ungi-lo" - Mc. 16, 1

Temos uma dúvida, e a pedra
é densa
Os olhos desatados do sono
manhã cedo, como passarão
os aromas pelas frestas do sepulcro?
Os aromas furtivos

Quem nos revolverá a pedra
a grande pedra da noite
e abre a boca da morte?

28/7/2012

Tuesday, August 28, 2012

QUASE NAUFRÁGIO


As ondas subiam por cima do barco
o barco entrava
no caracol das ondas
o vento subia pelos cabelos
os olhos subiam até às estrelas
os homens lançavam o medo nas vozes



E até a luz da lua
descendo pelas nuvens
fazia desenhos de medo sobre as águas


E no fundo do barco
que pensamentos na cabeça divina
dormem
alheios à tempestade?


21/4/2012

Saturday, August 18, 2012

BANDA DESENHADA EVANGÉLICA



Em notas de trabalho sobre a “Saudade”, José Ortega y Gasset escreveu que a “saudade não é um tema português; é o tema português. A saudade é o desejo de voltar.
À adolescência, por exemplo.
Intróito necessário para uma lembrança “literária”, dessas que surgem como o cometa Halley, e depois se perdem entre as galáxias das décadas e de inúmeras coisas úteis, literariamente falando, e outras meramente editoriais oportunísticas e meras nebulosas, no mau sentido, no “sistema solar” das nossas editoras evangélicas, que não são mais que entrepostos da colonização das traduções de má qualidade, teológica e literária.
Intróito talvez já longo para falar de “ As Viagens do Apóstolo Paulo”.

Banda desenhada, melhor, arquétipo de banda desenhada na melhor tradição sueca da primeira metade do século XX, publicada em revistas de conteúdo evangélico. O autor foi um artista, pintor e, possivelmente, escritor sueco, Bror Oscar Belfrage (nascido em 1905-), que em 1960 vivenciou através dos desenhos a preto-e-branco, das legendas e dos textos do próprio Livro dos Actos dos Apóstolos a vida e as viagens do Apóstolo dos Gentios.

O primeiro volume dá-nos a conhecer a personagem Saulo/Paulo a partir do encontro com Jesus na estrada de Damasco. Explica detalhes da vida quotidiana na Grécia e Chipre, no tempo paulino. O segundo, culmina com as viagens e as vivências do Apóstolo de Malta até à Itália.

Contextualiza geografias com os episódios em que Paulo desenvolve a sua pregação do Evangelho. Reproduz capítulos inteiros dos Actos, designadamente no 2º volume, a partir do cap. 25, ipsis verbis, como suporte textual da banda desenhada.

Foram ambos os volumes editados em Portugal pela antiga Casa Publicadora das Assembleias de Deus, ainda na sede da Rua Senhora do Monte, 14, à Graça, Lisboa, e impressos na Suécia, ou em fins da década de 50, ou com toda a certeza entre 1960 e 1962 ( esta data está manuscrita num dos volumes, pelo punho do meu Pai ( José Parreira, 4/10/1962) )

18/8/2012

Thursday, August 02, 2012

DISCUSSÕES DIVINIZADAS

                                         
Adão discute com Deus sobre os erros alheios, os da sua mulher.

Caim discute com Deus convencido de que Deus não é Omnipresente.

Abraão discute com Deus sobre as probabilidades da demografia dos justos em Sodoma.

Jacob discute com o Anjo do Senhor, esgrimindo argumentos terrenos, à força de braços.

©

Wednesday, July 25, 2012

Os Discípulos de Emaús



Estavamos sentados. Os olhos

convertidos às suas mãos

quando partia o pão

no escuro

abrindo-nos a luz.


25/7/2012

Saturday, July 07, 2012

Os Pés na Poça do Anti-Semitismo



Esta expressão, usa-a Bernard-Henry Levy no seu livro essencial O Século de Sartre. Quis dizer-nos que a França foi essa poça, durante e após o Holocausto e Auschwitz, em relação aos seus judeus, e que o filósofo Jean-Paul Sartre meteu os pés nessa «poça» para a denunciar.

Ainda hoje é preciso confrontarmos a nossa consciência cristã perante o que se designa por anti-semitismo. É que a história não nos põe de lado no que concerne a essa interpelação. Não foi só depois de Auschwitz que a poesia se tornou impossível, no dizer de Adorno, a nossa posição de cristãos evangélicos também, diante do que se designou e continua a chamar-se, com menos estrondo, é certo, «o problema judaico».

Mas há uma «questão judaica»? No século XXI? Sartre definiu-a em 1944, ainda se silenciava os nomes dos Campos de Extermínio nazi, e depois perante a hipocrisia dos franceses e até de alguns autores católicos, existencialistas cristãos, como Gabriel Marcel.

A questão judaica, que integra o que desde o século XIX se passou a chamar anti-semitismo, está a julgamento na história entre dois lexemas: aquele anti- e o racismo.

Racismo é, parafraseando Freud, «o ódio ao outro»; mas é um ódio à diferença visível: é negro, é branco, é cigano, é pobre, etc. O anti-semitismo não deixa de ser neste sentido um ódio à diferença, o ódio pelo outro por causa da diferença invisível, imperceptível.
Os judeus eram essa diferença, tinham a marca no rosto invisível, dizia-se que podiam corromper o mundo, secretamente. E se alguma literatura reflectiu isso com frases como «Weiss era mesmo alguém que trazia o destino estampado no rosto»( in A Pena Suspensa, de Sartre), a religião sobretudo acrescentou o maior contributo.

O facto conceptual continuou pelos séculos fora, tal qual o escritor francês, falecido em 1980, o escreveu no diálogo entre dois personagens judeus, no romance citado: «Mas o que é um judeu? É um homem que os outros homens consideram judeu.»
Antes e depois de Lutero.

A verdade é que Martinho Lutero não está isento de culpas quanto a essa consideração, por razões conceptuais baseadas na religião, designadamente num catolicismo medieval, que combatia alegadamente a cabala judaica com outra cabala, considerando os judeus como uma raça oriunda do Averno.

A historiografia do anti-semitismo não favorece o Grande Reformador protestante. Infelizmente. As suas próprias declarações sobre o que entendia ser o judeu, o comprometeram para o futuro.

No Julgamento de Nuremberga, Julius Streicher, o director do perverso Der Sturmer, jornal nazi e anti-semita, afirmou «que se tinha que ser levado a tribunal para responder pelo seu contributo para o assassínio em massa dos judeus, então Lutero – o pai da tradição anti-semita luterana, cuja anti-semitismo derivava da tradição católica- deveria estar a seu lado.»
Cartazes anti-semitas da juventude hitleriana, já em 1936 expunham publicamente como o alemão via o judeu, visão estruturada numa imagem religiosa: «Nós jovens, avançamos alegremente virados para o Sol…Com a nossa fé expulsamos o Diabo da Terra…» O Diabo, em maiúsculas, era o Judeu.
Justificações ilógicas apontavam num só sentido: os judeus crucificaram Jesus Cristo. O ódio religioso, do domínio da historiografia religiosa, que se transformou depois em ódio científico e sistemático, nas estruturas nazis da Solução Final, dirigido contra os judeus, era a resposta ao ódio «assassino» dos mesmos contra Jesus.

Perante a História não podemos deixar de pensar, no século XXI, que houve ( ainda há?)um anti-semitismo cristão, e que o Cristianismo, no que respeita ao aniquilamento europeu dos judeus na década de 40, ignorou teológica, social e humanitariamente, a raiz do Amor divino, demonstrado nas próprias palavras sofredoras de Cristo, na cruz: «Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem.»

Se Adorno afirmou que depois de Auschwitz não podia escrever-se mais Poesia, há porém algumas coisas que devem ser feitas pós-Holocausto. Para um Luteranismo puro tem que haver uma revisão aos comentários da História do anti-semitismo, com um pedido de perdão do Cristianismo, e também dos Evangélicos porque não basta aos mesmos fazerem apenas excursões a Israel, para visitar os lugares santos. O lugar santo deve começar no nosso interior, expurgando a nossa maneira de ver o outro, o Judeu.

2009

Wednesday, July 04, 2012

Três Salmos de "Falando Entre Vós Com Salmos"

SALMO 7


Aos que me perseguem, o Senhor apaga
o meu rasto, esconde os meus passos
dos olhares felinos, o meu coração
está aberto para Ele
Meu Deus haverá remédio para mim
a minha alma já não teme o teu arco curvado
nem as setas inflamadas
começa a aprender os altíssimos louvores
na tua própria língua.


SALMO 51


Ó Deus, o meu pecado ensurdece-me
é no meu interior um ruído
como a convulsão da terra, antes do sismo
os meus delitos entraram na corrente sanguínea
dá-me, ó Senhor, um coração branco
renova a verdade que um dia escolheste
nos meus olhos, como a neve nos ramos
das árvores, embranquece
os meus ossos humilhados
e os lábios
desenharão palavras de alegria.


SALMO 121


A dureza dos montes começa nos meus olhos
um paradoxo
para quem tem sublimes alparcas de voar
por isso fecho os olhos e os lanço
fora da órbita do mundo
para ti, Senhor, que fizeste o azul
onde puseste esta raíz dos homens
que é a terra
não haverá queda porque teus passos
são os mesmos do Senhor, diz
a voz que extingue dentro de mim
os medos que o Sol e a Lua
costumam esconder.


do livro “Falando entre vós com Salmos” (inédito)

Saturday, June 16, 2012


Depois de ler o artigo do Prof. Pe. Anselmo Borges no DN, sobre Charles Pépin:

Un homme libre peut-il croire en Dieu? fortaleci o pensamento de que foi, de

facto, o Cristianismo que criou a Liberdade ("Se o Filho vos libertar,

verdadeiramente sereis livres" - disse Jesus Cristo).
 

Porque Ele próprio criou a Libertação.

E não há liberdade sem libertação, disse Paulo Freire pouco antes de morrer em

1997.

Tuesday, June 05, 2012



Os corvos de Elias não conheciam o dia de amanhã
mas sabiam ser uma ponte aérea
entre Deus e o profeta
Os corvos de Elias não pensavam na cor
das suas penas, não pensavam no sol
do dia seguinte, na chuva que não desceria
também bebiam nas águas do ribeiro
Os corvos de Elias sem relógios
conheciam da manhã e da noite
o que levavam no bico.

25/4/2012

Thursday, May 17, 2012

Dói-me Jerusalém


"Me duele España"
Miguel de Unamuno


Dói-me Jerusalém, os ossos
que ficaram pedra sobre pedra
dói-me o muro
onde os rostos se descascam
das lágrimas, onde os lábios
segredam
as Lamentações trágicas da vida
doem-me
as alturas desmedidas do Sinai
o frio das pedras
onde antes um fogo se acendia
dói-me a sarça extinta
e doem-me os sete braços
do candelabro, levado para Roma
por um preço insuportável.

16/5/2012

Wednesday, May 02, 2012

SEM SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE O ÚLTIMO VERSÍCULO DE ACTOS

            

o derradeiro versículo do cap. 28 de Actos do Apóstolos não tem, felizmente, solução de continuidade. Não pesa nele a interrupção.

“ Pregando o reino de Deus, e ensinando com toda a liberdade as coisas pertencentes ao Senhor Jesus Cristo, sem impedimento algum”

Pese embora a referência da narrativa ser dirigida ao trabalho derradeiro do Apóstolo Paulo em Roma, a intertextualidade da diegese não é apenas particular, é universal no que concerne à Missão da Igreja e aos Actos do Espírito Santo, que não cessaram.

Este versículo permite muitas perguntas e outras tantas respostas, mas nenhuma dúvida.
O final não é apenas histórico, no que concerne à biografia de Paulo escrita por Lucas, é sobretudo teológico, e, como tal, de continuidade. É portanto demasiadamente claro.

Em comentários bíblicos abrangentes de todos os versículos do Novo Testamento, por exemplo, encontramos alguma unanimidade na interpretação.
Lucas pretendia escrever um terceiro volume( o seu Evangelho e os Actos, dois tomos de uma mesma obra) para registar o julgamento e libertação de Paulo – dizem uns; a narrativa dá como terminada a história naquela circunstância da prisão fora do cárcere (a já usada prisão domiciliária) de Paulo – propõem outros. Ou o “fim abrupto da história de Paulo”, conforme a opinião do teólogo Oscar Cullmann.

A verdade é que “Paulo estava restabelecido e a sua coragem reanimada pela graça(...); é ele quem encoraja, quem actua, sempre da parte de Deus, no meio de toda a cena”- escreve John Nelson Darby (J.N.Darby), num comentário com quase dois séculos aos Actos (1). E, facto importante e até curioso, a história da relação de Roma com o Evangelho, a pregação do Evangelho, faz-se com a prisão de Paulo nessa cidade imperial.

Paulo pregava o Reino de Deus e ensinava acerca de Jesus Cristo. E esta acção não foi nem é jamais o fim da História da Igreja, essa História presente é um contínuo de somas desde o Século I, enquanto a Igreja não for secretamente arrebatada por Jesus.

Uma intertextualidade literária

Atalhando caminho para uma intertextualidade clássica, uma vez que os capítulos 27 e 28 de Actos são especialmente considerados também clássicos, do nível literário, e.g.,da Odisseia (de Homero) ou, salvo melhor opinião, do Canto I, de Ezra Pound, permitam-me que cite a mim próprio:

“ No texto de Actos, o evangelista coloca a narrativa dentro da própria moldura da História e da biografia de Paulo, enquadrando-a nas circunstâncias políticas, religiosas e geográficas do seu tempo. (…) Particularmente, a descrição com todo o seu ambiente, sai dos mares jónicos e torna-se, por si própria, num dos únicos e mais importantes documentos históricos sobre um naufrágio. (...)Rigorosamente, as mesmas qualidades evidentes nos trechos das obras clássicas de Homero e Pound (separadas por quase três
milénios ) são notadas, também, na excelência do texto bíblico dos Actos dos Apóstolos.” (2)

O carácter daqueles dois capítulos não é porém a ficção, é a verdade. Mas Lucas usou expediente literário para nos indicar que o derradeiro versículo da sua narrativa, era uma porta não fechada. E poderia bem terminar em suspenso com um “Assim que...”, como o citado Ezra Pound utilizou para a sua parafrase (o Canto I, de “The Cantos”, sua obra-prima no século XX) do Canto ou Rapsódia nº XI da Odisseia de Homero.

“De modo que /Assim que”/ “So that:” -no original do poeta anglo-americano Pound- é um expediente cronológico que parece suspender para relançar a acção a seguir, uma passagem, uma ligação entre um passado e um futuro, em continuidade, que casou a poesia narrativa de Homero e a poesia lírica da Idade Média (3)
.
Por seu lado, o versículo inteiro e último de Actos é essencial para essa ligação, de um passado, de uma história que ainda decorre e do futuro. Parafraseando um verso célebre de Miguel Torga (do poema Dies Irae), todo o futuro está neste dia de hoje do versículo.

Crepúsculo, aparente, e Alvorada, apenas duas palavras com as quais podemos qualificar o versículo 31.

Mas é exactamente nas palavras que a continuidade e o futuro se perfilam, na afirmação final do autor evangélico sagrado, que as coisas pertencentes ao Senhor Jesus Cristo estavam a ser ensinadas, propagadas, “sem impedimento algum”.

Teremos de socorrer-nos do Novo Testamento Grego (4) e pôr em relevo os dois vocábulos finais: parrêsias, akôlutôs.

O que significam dá-nos a medida, o primeiro, de uma abertura de par em par pela qual se entra com ousadia; o segundo, que tal entrada e caminhar não têm obstáculos permanentes nem absolutos. O versículo derradeiro dos Actos dos Apóstolos é um final aparente que contém um princípio contínuo em si mesmo.
Sendo história humana estaria limitado ao tempo, anos, meses, horas, segundos, mas é História de Deus.

Não com o rigor da disposição cronológica das cartas paulinas no NT, que não existe, mas pelo posicionamento tradicional no Cânone, a epístola aos Romanos não sendo a primeira que ele escreveu e tão pouco a que redigiu na sua prisão na cidade imperial, é o seguimento natural do Ensino teológico concernente ao Reino de Deus e ao Evangelho de Jesus Cristo.
A carta aos Romanos é considerada mais Tratado de Teologia do que Epístola. E assim é que poderíamos ligar, com alguma liberdade respeitosa, o versículo 31 de Actos aos versículos 1 e depois 16 do cap. 1 de Romanos. E temos a razão da continuidade.
A raison d'étre da pregação do Evangelho de Deus é a História da Igreja.

______________________________________________________
(1) “Estudos sobre a Palavra de Deus”, Depósito de Literatura Cristã, 1987

(2) Revista “O Obreiro”, nº 26, Janº/Marº 1984, CPAD; e “Bara-Cadernos Culturais, III”, s/data

(3) A Odisseia, Homero, Canto XI, Biblioteca Editores Independentes, pág.180 ss, trad. Frederico Lourenço; “Os Cantos”, Ezra Pound, Editora Nova Fronteira, pág. 21 ss, trad.José Lino Grunewald.

(4) Novum Testamentum Graece, Nestle-Aland

(Texto a sair na revista "Novas de Alegria"                                                                                                          

Saturday, April 14, 2012

A RESSURREIÇÃO

Sem nada por que chorar
senão o túmulo vazio
e dois anjos a arrumarem a casa
vazia para sempre
sem nada sobre o que derramar o seu incenso

as mulheres
recém chegadas ao sepulcro
vão gastar os olhos na vigília

as mulheres sem um corpo onde encostar
o seu olhar silencioso
o fio das suas lágrimas

e regressam, as mulheres
regressam com o vento nas sandálias

as mulheres que vêm com o medo
mas com os cabelos como os ramos
perfumados de alegria.

7/4/2012

Thursday, March 22, 2012

Salmo 137 em português moderno

 
 
 
Não invocámos pequenos prazeres
junto aos rios da Babilónia
nas margens havia salgueiros
e neles pendurámos nossas lágrimas
nem pequenos passeios
de barco, no sossego das águas
aos sábados
pendurávamos a vida
nesses dias à beira dos rios
da Babilónia, imóveis
só tomávamos o ar.

21/3/2012

Wednesday, March 14, 2012

Rua chamada Direita


Rua Direita, em que o sol estreita os raios
num único os raios oblíquos
uma rua de Damasco, simples endereço
onde por um acidente celeste
Saulo entrou, hóspede
dos planos divinos e esperava
os dias eram cegos com o olhar colado a escamas
tremia ainda, pelo calafrio da luz
que penetrara até à raíz dos olhos?
pela Voz que, qual punho, o derrubara
na poeira de veludo da estrada de Damasco?

14/3/2012

Monday, February 27, 2012

Escalar as feridas do Sinai



Escalar as feridas do Sinai
enquanto o fogo descansa na montanha
escalar Athos com os pés molhados no Egeu
desafiar as pedras
como se fossem duros deuses terreais
fazer pelos Himalaias o caminho
até que o mundo seja apenas
o azul, luzindo
nas águas do sol propenso à alegria
escalar os Alpes
os penhascos em risco e os gelos mortais
até desviar da noite a Estrela d'Alva.

26/2/2012

Thursday, February 16, 2012

TROFÉUS

Com mãos mercenárias como se fossem aves
de rapina
romperam teus vestidos, relíquias
com os fios da tua veste, a tua última
túnica com forma unânime
levaram para casa, com as mãos sujas
guardaram um pouco do brilho
do teu sangue.

16/2/2012

Tuesday, February 14, 2012

A Cultura do Cristianismo em risco na Europa





O património da Europa, que está a aproximar-se da destruição, senão do suicídio, ao fundar-se em valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, assenta fundamentalmente sobre valores religiosos e estes valores são matéria do Cristianismo.

A fundação da Cultura do Cristianismo pelo apóstolo Paulo não está, porém, cativa de um passado remoto. Na segunda metade do Primeiro Século – a partir do ano 50 a.D - já essa Cultura, essa Nova Luz, a Idade do Ouro que até Virgílio, o poeta latino, vaticinou (Bucólica Quarta), se preparava para ser coluna no futuro.

Tolerada ou sentida com temor pelas instâncias do poder romano(Actos 24,25) e «reconhecida» nos seus fundamentos pela curiosidade do espírito cultural grego (Actos 17 ), ajudaria a conduzir da Patrística à Reforma o Pensamento dos cristãos, e a despeito de muita dialética materialista no século XX, um autor como Harold Bloom teria que colocar Paulo como um autor bíblico fundacional a par de Dante e Shakespeare. Para o autor do Cânone Ocidental, Paulo esteve também na base da ontologia do Ser.

Este começou por estruturar a Cultura Cristã dentro das balizas da cultura do judaismo. Na referência biográfica que faz de si próprio nas epístolas aos Coríntios e aos Filipenses, não enjeita suas origens, as quais eram motivo de orgulho no tempo anterior ao Caminho de Damasco.

Assim, imensamente por causa do trabalho missionário de Paulo, que abarcou o Oriente e o Ocidente, a remota Ásia Menor e a Europa, a Cultura do Cristianismo foi uma cultura de rotura. A cultura de rotura com os valores, com a amoralidade e a imoralidade, do secularismo, começou a ser veiculada pelas Comunidades dos cristãos, pela Igreja.

E sem excepção, as Epístolas de Paulo, não excluindo como é óbvio as cartas dos demais apóstolos, contribuiram para tal cultura de rompimento. Paulo confirmou doutrinariamente toda a historicidade do relato de Lucas nos Actos, Paulo tornaria o Cristianismo num Facto histórico, resgatando-o da ideia da época de ser uma seita do judaismo. Desde um ponto de vista histórico o cristianismo supõe o principal aportamento do povo hebreu e uma das mais importantes influências semíticas junto com o alfabeto – no âmbito geo-cultural ocidental. Já se escreveu que «a religião cristã foi um factor primordial na hora de formar o sentido da identidade europeia.»

A Igreja bíblica está fundada sobre a Doutrina dos Apóstolos, a Europa subtraída às hostes da barbárie tem nas suas fundações os veios auríficos dos valores imbatíveis dessa Doutrina. Assim o Cristianismo não pode ser visto apenas como a Religião, é também a Identidade.

(Excertos de artigo publicado em "Novas de Alegria", de Dezembro de 2003.)

Tuesday, February 07, 2012

O Dia que abalou o Mundo

10 de Novembro de 4004 a.C, dia da expulsão de Adão e Eva do Paraíso segundo a Cronologia de James Usher, in The Annals of te World.
 
 
 
Saíram em silêncio, nesse dia
fora dos muros do Jardim, o hálito
das bocas com um fruto
e o perfume dos corpos
e a libido
Passaram do círculo
do verde para as pedras
do suave gemido da nudez
para a rudeza dos vestidos
Teriam enfim a sua idade
como as árvores ou os lobos
a nostalgia na hora do uivo
passaram a prova da coisa proíbida
e agora
com os pés para a Morte
já tinham um sentido
4/2/2012

Saturday, January 28, 2012

Holocaust Memorial 27th of January

Kaddish por Nós


Quando eles nos mataram
a nossa cinza falou por nós

quando mataram nossos filhos tivemos mais
quando mostraram as nossas mulheres nuas
nossos olhos fecharam para sempre
houve cidades em que o vento
não trazia pássaros
mas cinzas.
 

Wednesday, January 18, 2012

Suicídio na Linha

Mulher entre os 60 e os 70 anos atirou-se de braços abertos para a frente da automotora que ligava Aveiro-Águeda”

in Diário de Aveiro, de 17/1/2012


Não suportou a cruz, o peso
disperso pelos braços
Uma faca que cortou um amor
desencontrado? O silêncio
a inundar-lhe os ouvidos?

Ou uma ária cigana
tocada nas cordas invisíveis
das lágrimas?

Desistiu de ver as mãos vazias e os olhos
sem futuro? Não suportou os deuses
entretidos à porta das igrejas
a falarem de arte?

Atirou-se de braços abertos
sem ninguém.

18/1/2012

Saturday, January 14, 2012

Vocabulário

Coisas que sairam das mãos de Deus, na Criação, e que começaram a ser sem as palavras ainda: Flor, Estrela, Rio. A Criação antes da Nomeação. Só o Homem, já tinha palavra antes do Criador o moldar com Suas mãos.